Acho que cresci e virei uma criança birrenta e mimada. Lembro-me quando caia aos 4 anos e tinha mil pessoas me pegando no colo e me dando todo o amor do mundo e atenção para o meu ralado.
Fiz 8 anos, meu irmão nasceu e meu pai estava sempre ausente por causa do trabalho. Então eu chutei uma bola e prendi meu pé na cerca, o sangue estava quente, não senti dor alguma, apenas olhava aquela ferpa enorme no meu pé.
-Mae!!! Eu prendi o pé!!! Me ajuda!
Lembro de ficar uma eternidade, talvez fosse a adrenalina e ela mandar eu sair dali sozinha, talvez por que no outro dia prendi a calça e gritei por ela. Talvez ela pensasse que é só a birra do filho mais velho…
Eu só sei que puxei meu pé dali. E a dor veio após 3 passos, o sangue desceu e eu comecei a chorar. As vozes na minha cabeça diziam que eu ia morrer, que ia infeccionar, que eu ia agonizar e perder o pé igual vi em um canal da tv.
Era só um pequeno machucado, mas minha visão estava embaçada, a visão turva e o peito doendo e faltando ar, queria gritar e pedir ajuda, mas… mas ninguém viria. Ninguém veio.
Naquele dia manquei até o tanque de lavar roupa, lavei o pé até estancar. Ouvi minha avó chiando que estava melando o chão de sangue, que ia manchar o piso.
E então peguei um pano e foi em um pé só limpar a "bagunça". As vozes riam. E eu sentia um nó na garganta, eu chorava muito.
Minha mãe veio quando levei um ou dois tombos tentando limpar e ficar em pé. Lembro que depois ela colocou um bandaid no meu pé e que era só um furinho.
Por dentro ficou preto, manquei por muitos dias, pareceram meses. E sempre que via a cicatriz eu lembrava de como fui abandonada…
Eu sou descartável.
E esse sentimento solitário me fez parar de gritar por ajuda. Me fez engolir meus medos e seguir sozinha como se enfrentasse o mundo só eu e eu mesma.
As vozes me comiam viva… e ninguém percebia. Como aquele pé ferido por dentro….
Eu aprendi a chorar quieta… a cicatriz era minha única companheira, provando que tudo aconteceu e que não foi só uma alucinação tola.
Era só eu… e o mundo inospito.
É só uma cicatriz boba, que eu desejei que jamais sarasse. Pois sem ela, minha mãe jamais acreditaria em mim... Ela jamais acreditaria...
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